segunda-feira, 21 de abril de 2014

Castigo ou perdão?




I. PARA QUE SERVE O CASTIGO?

O castigo tem por finalidade uma mudança do comportamento.

Há castigos naturais que resultam da teimosia da criança em mexer numa vela acesa ou se aproximar de um forno quente. Mas a nossa preocupação é quando o comportamento não muda. Castigo após castigo, o comportamento não muda e pelo contrário provoca revolta e ódio na pessoa que não reconhece o erro de modo algum.

Se a aplicação de uma penalidade causa revolta é porque a pessoa não reconhece que errou. Será portanto importante mostrar-lhe as consequências do seu erro na sua própria vida pessoal e o primeiro castigo para obrigar a uma reflexão sobre o ato, enquanto a cabeça do “juiz” arrefece um pouco, é colocar imediatamente o prevaricador a escrever num papel algumas ideias sobre o seu ato. Para o ajudar a refletir faça-o responder a algumas perguntas:
- O que é que eu fiz / disse?
- Que sentimentos provoquei nas outras pessoas?
- O que é que eu posso perder com este ato?
- Porque é que eu fiz / disse isto?
- O que estou disposto a fazer para reparar o meu erro?

Há muita variedade de castigos:
- físicos;
- privação da liberdade;
- subtracção de bens, definitivamente ou temporariamente;
- humilhação da pessoa.

1. Arrependimento.

O castigo não tem qualquer eficácia se não houver arrependimento. Contudo, é aplicado, haja ou não arrependimento. Portanto, o nosso foco deve ser em primeiro lugar o arrependimento da pessoa e depois disso, o castigo. Naturalmente que estamos a focar mais a educação dos filhos do que a punição do um vizinho ou irmão. Os princípios são contudo transversais.

A diferença entre o reconhecimento da falta, ou não, influencia os resultados seguintes. Veja este caso:

"Então um dos malfeitores que estavam pendurados, blasfemava dele, dizendo: Não és tu o Cristo? salva-te a ti mesmo e a nós. Respondendo, porém, o outro, repreendia-o, dizendo: Nem ao menos temes a Deus, estando na mesma condenação? E nós, na verdade, com justiça; porque recebemos o que os nossos feitos merecem; mas este nenhum mal fez." Lucas 23:39-41

Aqui temos o caso de um ladrão arrependido que reconheceu que merecia o castigo dos seus erros e de outro que nem na hora da morte teve pudor em controlar a sua língua. Apesar do mesmo castigo no momento estar a ser aplicado a ambos, Jesus a um no instante seguinte prometeu o Paraíso, o outro permaneceu na condenação.

2. Não arrependimento.

A pessoa que não se arrepende invariavelmente tem uma boa argumentação e muitas desculpas para justificar o seu ato. Foi assim no início e continua a ser hoje em dia.
- a mulher que me deste é que me deu a comer;
- a serpente é que me enganou.
(Génesis 3:12,13)

Haverão decerto muitas razões para que a pessoa não queira se arrepender mas esse não é o foco deste conteúdo no momento.

3. Mudança.

Há arrependimento que é apenas pontual e há arrependimento que gera mudança.
Arrependimento e conversão (ou mudança) são duas coisas diferentes.

“Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os vossos pecados, de sorte que venham os tempos de refrigério, da presença do Senhor.” Atos 3:19

A leitura mais ligeira deste versículo faz-nos perceber que ARREPENDIMENTO acompanhado de MUDANÇA é que faz com que a transgressão seja (ou possa ser) anulada e a consequência disso é o BEM-ESTAR efetivo.

A mudança é que produz bem-estar definitivo. Um arrependimento pontual sem mudança de carácter pode nos safar de alguma enrascada mas não é garantia de que tudo irá correr bem daí para a frente.

A pessoa que apenas se arrepende, pode fazê-lo porque foi descoberta ou denunciada, mas voltará ao mesmo erro num momento de distração e ou se achar que desta vez não vai ser descoberta. A diferença que a faz reincidir no mesmo erro é a sua atitude, mudança, “coração” ou carácter.

4. Sacrifício.

O primeiro pecado da humanidade requereu um castigo, o sacrifício de um cordeiro inocente. Antes disso Adão já tinha percebido que tinha errado, pois sabia que estava nu, e por isso tinha se escondido de Deus.

Depois disto os sacrifícios para expiar pecados repetiram-se entre os hebreus e outros povos e culturas seguiram-lhes o exemplo.

O sacrifício é o ato punitivo mais elevado para pagar um pecado grave. O sacrifício está ligado com morte. Alguns exemplos de sacrifício são:

- o primeiro sacrifício de um cordeiro inocente para expiar o pecado de Adão e Eva;
- a morte do prevaricador, como um acto de vingança por parte do ofendido;
- a pena de morte, existente em alguns países, como pena máxima contemplada pela Lei;
- A dádiva pessoal de um bem que estimamos muito. Há pessoas que não são capazes de fazer certas coisas porque isso representa um “sacrifício” pessoal muito elevado;
- “Sacrifício vivo” é um culto a Deus. (Romanos 12:1);
- Penitência;
- Jejum. Eventualmente um arrependimento pode até trazer falta de apetite mas também pode ser uma forma de sacrifício voluntário, como consequência de um erro e na expectativa de que uma consequência mais grave não seja atribuída.

5. Penitência

Vamos encarar a penitência como algo lícito nas escrituras, pois sabemos que Deus não se agrada de sacrifícios para expiar pecados mas prefere um coração verdadeiramente arrependido.

A penitência são atos voluntários da pessoa que deseja provar a Deus e/ou aos outros de que está arrependida do seu ato.
“Então disse Davi a Natã: Pequei contra o Senhor. Tornou Natã a Davi: Também o Senhor perdoou o teu pecado; não morreras. Todavia, porquanto com este feito deste lugar a que os inimigos do Senhor blasfemem, o filho que te nasceu certamente morrerá. Então Natã foi para sua casa. Depois o Senhor feriu a criança que a mulher de Urias dera a Davi, de sorte que adoeceu gravemente. Davi, pois, buscou a Deus pela criança, e observou rigoroso jejum e, recolhendo-se, passava a noite toda prostrado sobre a terra. Então os anciãos da sua casa se puseram ao lado dele para o fazerem levantar-se da terra; porém ele não quis, nem comeu com eles. Ao sétimo dia a criança morreu.” II Samuel 13-18

David reconheceu o seu pecado, foi perdoado, mas vieram consequências. A razão porque ele se “penitenciou” está mais à frente: “Respondeu ele: Quando a criança ainda vivia, jejuei e chorei, pois dizia: Quem sabe se o Senhor não se compadecerá de mim, de modo que viva a criança?” II Samuel 12:22

Concluímos portanto que o castigo faz parte do processo natural como consequência de um erro. Pode ocorrer eventualmente um perdão incondicional, mas isso não é a regra. A regra é que todos os erros têm consequências.

6. Aceitação do castigo.

A pessoa que reconhece o erro não se revolta com a aplicação de uma pena, apenas se submete humildemente às consequências.

“Mas o coração de Davi o acusou depois de haver ele numerado o povo; e disse Davi ao Senhor: Muito pequei no que fiz; porém agora, ó Senhor, rogo-te que perdoes a iniquidade do teu servo, porque tenho procedido mui nesciamente. Quando, pois, Davi se levantou pela manhã, veio a palavra do Senhor ao profeta Gade, vidente de Davi, dizendo: Vai, e diz a Davi: Assim diz o Senhor: Três coisas te ofereço; escolhe qual delas queres que eu te faça. Veio, pois, Gade a Davi, e fez-lho saber dizendo-lhe: Queres que te venham sete anos de fome na tua terra; ou que por três meses fujas diante de teus inimigos, enquanto estes te perseguirem; ou que por três dias haja peste na tua terra? Delibera agora, e vê que resposta hei de dar àquele que me enviou.  Respondeu Davi a Gade: Estou em grande angústia; porém caiamos nas mãos do Senhor, porque muitas são as suas misericórdias; mas nas mãos dos homens não caia eu.” II Samuel 24:10-14

De seguida encontramos David a caminho para sacrificar ao Senhor para que cessasse a praga sobre o povo assumindo ele a culpa total pelo seu erro, e mais:

“Então disse Araúna a Davi: Tome e ofereça o rei meu senhor o que bem lhe parecer; eis aí os bois para o holocausto, e os trilhos e os aparelhos dos bois para lenha. Tudo isto, ó rei, Araúna te oferece. Disse mais Araúna ao rei: O Senhor teu Deus tome prazer em ti. Mas o rei disse a Araúna: Não! antes to comprarei pelo seu valor, porque não oferecerei ao Senhor meu Deus holocaustos que não me custem nada. Comprou, pois, Davi a eira e os bois por cinqüenta siclos de prata. E edificou ali um altar ao Senhor, e ofereceu holocaustos e ofertas pacíficas. Assim o Senhor se tornou propício para com a terra, e cessou aquela praga de sobre Israel.” II Samuel 24:22-25

Uma pessoa verdadeiramente arrependida, não cumpre apenas com o castigo proposto, mas se predispõe a fazer muito mais do que lhe é pedido como retribuição pela sua culpa. Isso prova o seu arrependimento mas também a qualidade do seu carácter.

6. O castigo traz paz

Que estranho…, uma coisa que dói, poder trazer alívio.

“Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e esmagado por causa das nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.” Isaías 53:5

“O que arde cura”, diz o povo. Mas como é que um castigo pode trazer paz? Naturalmente que só pode trazer paz à consciência que está pesada. Se pagamos pelo nosso erro, se o confessamos, ou penitenciamos, de forma que não desagrade a Deus claro, alcançamos alívio.

7. Quem não corrige os filhos, trata-os como bastardos.

“… Filho meu, não desprezes a correção do Senhor, nem te desanimes quando por ele és repreendido; pois o Senhor corrige ao que ama, e açoita a todo o que recebe por filho. É para disciplina que sofreis; Deus vos trata como a filhos; pois qual é o filho a quem o pai não corrija? Mas, se estais sem disciplina, da qual todos se têm tornado participantes, sois então bastardos, e não filhos.” Hebreus 12:5-8

O castigo ou a correção, tem como propósito o bem e não o mal. Filhos rebeldes são o resultado de falta de correção, falta de disciplina e falta de castigos.

II. PARA QUE SERVE O PERDÃO?

O perdão tem por finalidade restaurar os relacionamentos.

1. O perdão faz cessar as hostilidades.

O perdão é capaz de aplanar toda a estrada tortuosa que exista no caminho. Por vezes a convivência é possível entre pessoas que se agrediram mas cedo ou tarde a memória virá ao de cima trazendo o desejo de vingança.

O ódio e pequenas revoltas somadas ao longo do tempo arruínam a nossa vida a médio/longo prazo. Deve ter sido isto que Salomão observou nos seus contemporâneos e no seu irmão Absalão que morreu pela espada indefeso e pendurado pelos cabelos numa árvore.

“Guarda com toda a diligência o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida.” Provérbios 4:23

“Vendo os irmãos de José que seu pai estava morto, disseram: Porventura José nos odiará e nos retribuirá todo o mal que lhe fizemos. Então mandaram dizer a José: Teu pai, antes da sua morte, nos ordenou: Assim direis a José: Perdoa a transgressão de teus irmãos, e o seu pecado, porque te fizeram mal. Agora, pois, rogamos-te que perdoes a transgressão dos servos do Deus de teu pai. E José chorou quando eles lhe falavam.” Génesis 50:15-17

2. O perdão termina com o ressentimento ou mágoa.

A pessoa ofendida está ressentida e magoada. Se não for pessoa com temperamento de vingança irá afastar-se da pessoa que cometeu a ofensa. “mas as vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus” Isaías 59:2 

A ofensa causa separação, o perdão faz retomar o relacionamento.

3. O perdão pode restituir os bens perdidos, em parte ou na totalidade.

O caso do filho pródigo em Lucas 15 é o mais conhecido: “Pai, pequei contra o céu e perante ti, faz-me como um dos teus criados.”

No mínimo, aquele filho deixaria de passar fome, mas o Pai entendeu restituir-lhe tudo aquilo que ele tinha desperdiçado.

4. O perdão pode atenuar a pena.

Certa ocasião vínhamos de Sevilha depois de uma escapadinha de fim de semana e para fugir á portagem em Espanha viemos pela N-433 em direção a Serpa. Quem conhece a estrada sabe que ela é sinuosa e cheia de sinais de trânsito de diferentes velocidades. Quando a Guarda Civil nos mandou parar eu já sabia o que tinha acontecido. O meu assentimento fez com que a pena aplicada fosse a mínima: 50,00 €. Doeu, mas eu sabia que tinha cometido a falta. Se argumentasse ou negasse teria que pagar mais, até porque eles tinham a fotografia no radar deles.

Também, o bom comportamento de um prisioneiro pode reduzir a sua pena.

Por outro lado, o reincidente na mesma falta pode incorrer em agravamento do castigo, assim como aquele que nunca esteve na prisão também tem esse fator como atenuante.

Este tema foi provocado por um episódio na nossa casa e pretendeu responder a uma pergunta que foi colocada a mim e à Susana: Porque é que eu tenho de pedir perdão se vou ser castigada na mesma? Se eu pedir perdão porque tenho de ser castigada?

Uma forma inteligente de atenuar uma pena é presentear o ofendido. É vulgar ver um namorado ou marido arrependido com um ramo de flores na mão, embora o resultado seja por vezes o menos desejado. Jacó fez isso com o seu irmão Esaú quando passados 20 anos teve que se confrontar com ele depois de o ter enganado. Gn:32:14

“Toda Escritura é divinamente inspirada e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça.” II Timóteo 3:16



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