sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Não sou capaz de partilhar essa foto



De tempos em tempos as redes sociais são assaltadas com fotos mediáticas e eu não escapo a essa tendência de me associar às diferentes causas com elas relacionadas. A outra face desta questão é que há pessoas que ficam de olho nos nossos silêncios. Uns, mais do que outros, cobram dos líderes um pronunciamento sobre as diferentes questões políticas e sociais para que de alguma forma também possam ajustar a sua compreensão da questão, criticar ou aplaudir. Sem qualquer presunção eu sei que tenho uma pequena quota nessa exigência, legítima por um lado e perversa por outro.

O caos está de novo instalado na opinião pública. Por um lado os receios dos movimentos xenófobos e partidos de extrema-direita, e do outro, também, a invasão de uma ideologia igualmente xenófoba e cruel, que de modo nenhum se renderá aos valores europeus. Todos os artigos que leio oscilam entre a solidariedade e as preocupações.

Valores Europeus? Mas quais valores? Valores de solidariedade, unidade, fraternidade, justiça e cristandade? A Europa e outros países ocidentais enriqueceram durante anos à custa dos povos do “terceiro mundo”. Para quem não se lembra, depois da II Guerra Mundial, “primeiro mundo” foi o rótulo dado aos países capitalistas, “segundo mundo” ficou como reserva dos países socialistas industrializados e “terceiro mundo” sobrou para os que não se transformaram em nenhuma destas categorias. Ou seja, o primeiro e o segundo continuaram a saquear o terceiro, e o terceiro foi também invadido pela mentalidade de que todos os males da humanidade são culpa do primeiro. E em grande parte são. Não há como não assumir essa responsabilidade. Quem não se lembra dos Soviéticos em Angola e Cuba, e dos Britânicos, Franceses e Portugueses em África, Ásia e Índias?

Repetidamente, os nossos políticos fazem propaganda dos direitos e dos valores. Que bom senhores. Estão a referir-se, com certeza, também, aos direitos de um árabe ter várias esposas e inúmeros filhos assim como de beneficiar das respectivas regalias sociais no valor de milhares de euros, por exemplo. Não será de estranhar portanto que os repórteres também tenham de enfrentar a fúria dos nossos pobres com filhos nos braços e das famílias com deficientes a quem são atribuídas algumas malgas de café com leite e pão demolhado.

Por favor não tentem comover-me os donativos dos grandes clubes de futebol que por caridade tentam descarregar a sua pesada consciência com milhões desperdiçados nos seus ídolos com pés de barro. Esse comportamento faz-me lembrar as indústrias de bebida a fazerem prevenção de alcoolismo.

Tristemente, um grande número destes imigrantes que fogem das guerras e vêm em busca de melhores condições de vida mas a breve trecho, muitos irão descobrir que o El-Dorado é uma ilusão temporária que se converterá num novo deserto. A desilusão dará lugar à convicção fundamentalista de que “tudo isto é nosso” e aquilo de que fogem encontrarão na Europa: o ódio, o racismo, a espada e o sangue. Este comportamento já se reflecte dentro das barcaças em que ilusoriamente embarcaram quando damos conta dos vários relatos de assassinatos de cristãos no mar. Essas crianças não fotografadas também gritaram desesperadamente nos braços dos seus pais que em vão as tentaram proteger.

Com todo o respeito por todos quantos partilham a foto mais mediática do presente e cuja boa intenção é lembrar, e representar, todas as outras crianças vítimas do ódio da humanidade, eu prefiro não o fazer, embora ela já esteja irremediavelmente gravada na minha consciência para sempre.


Vamos regressar aos valores. O Homem transporta dentro si e para qualquer lugar a sua própria natureza. Os Europeus levaram o seu egoísmo para África. Agora, os africanos transportam o ódio dentro de si para a Europa. Repugna-me o discurso 
cínico dos políticos europeus quando ainda recentemente o assunto que vendia mais jornais era a Grécia. Agora procuram dividendos políticos e votos para as eleições seguintes estendendo as suas mãos manchadas com pólen de papel com um símbolo azul e dourado, pois se não o fizerem serão castigados pela opinião pública.

Pobre Europa. Durante tantos anos foi castigada com fundamentalismo cristão cego e religioso e agora que finalmente acordou (cinicamente) para a convivência pacífica entre as religiões e para os “valores humanitários”, ilude agora outros ainda mais pobres com promessas fúteis. E deveres? Quando começaremos a falar dos deveres dos cidadãos que estamos a acolher com este sorriso largo de bondade e mãos estendidas? Durante quanto tempo conseguiremos manter nos nossos penhascos as cruzes que tanto sangue nos custaram?

Sou cristão. Reconheço os meus pecados pessoais e os do meu povo. Peço perdão a Deus pelo pecado dos meus antepassados (ainda que saiba que nada possa resolver com isso a não ser declarar que os reconheço). Peço a Deus que me dê um coração íntegro e sacrificial em favor do meu próximo.

Não consigo abstrair-me dos pecados dos europeus nem do ódio fundamentalista que cada vez mais nos preocupa. Mas do que eu não me quero esquecer é do que Deus requer de mim: “Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e que é o que o Senhor requer de ti, senão que pratiques a justiça, e ames a benevolência, e andes humildemente com o teu Deus?” Miqueias 6:8

Samuel Dias

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